Toc...
Toc...Toc...
Aquela
batida na porta fez escritor interromper seu almoço. Mesmo mal-humorado, ele
gritou:
–
A porta está aberta... pode entrar!
A
porta se escancarou e a luz do Sol, lá fora, revelou a imagem de um homem
velhinho como eu, de barbas brancas, com roupas humilde e chapéu de palha nas
mãos, seguro em frente ao peito...
–
Com licença, Seu Bentinho!
–
Que surpresa, Barnabé! Há quanto anos! O que te traz aqui no Rio de Janeiro?
–
Sabe o que é, Seu Bentinho? Eu vim lá do sítio pra contar uma coisa que eu vi,
ontem, e que me deixou muito triste.
–
Triste? O que foi Barnabé? O que fizeram a você?
–
Não foi comigo, não, senhor... foi com a Tia Nastácia...
–
O que aconteceu com Nastácia? Está doente? Caiu? Se machucou?
–
De saúde está igual. Coisas do velho reumatismo, né? Mas, ontem, eu entrei na
cozinha e ela estava sentada num banquinho, chorando demais. E não consegui consolar ela de jeito nenhum...
–
Bem tratada, mais ou menos, né, seu Bentinho...
–
Como assim? Quem a está maltratando? Me fale que sou capaz de ir agora mesmo até o sítio para tirar
satisfação... gosto muito daquela preta velha...
–
Sabe quem maltratou a Tia Nastácia, Seu Bentinho?
–
Quem?
–
O Senhor...
–
Como assim? Eu jamais faria isso com ela... é uma pessoa querida...
–
O senhor sabe que a Nastácia, igual eu, não sabe ler, né?
–
Isso é verdade. O analfabetismo é o maior dos males desta terra... mas o que
isso tem a ver com o choro da Nastácia?
– Pois é... há tantos anos as crianças, que leem seu livro, aprendem que Tia Nastácia parece uma "macaca de carvão"... ninguém quer ser chamado nem de macaco, nem de carvão... não é verdade, Seu Bentinho?~
Lobato sorri amarelo e parece que vai se justificar, quando o velho Tio Barnabé lhe entrega uma folha de papel.
– O Pedrinho, que já está um homem formado, conheceu uma moça, amiga da Narizinho Arrebitado, muito bonita, pretinha que nem nós. Gostou dela, mas vendo como ela é tratada mal pelas pessoas, começou a ler de novo vários dos seus livros. Aí ele lhe escreveu isso aqui.
Entrega-lhe um bilhete pedindo:
Numa passada de olhos no bilhete, vê um trecho da carta a seu amigo Artur Neiva, de 1928: "País de mestiços, onde branco não tem força para organizar uma Kux-Klan, é país perdido para altos destinos […] Um dia se fará justiça ao Ku-Klux-Klan; tivéssemos aí uma defesa desta ordem, que mantém o negro em seu lugar, e estaríamos hoje livres da peste da imprensa carioca — mulatinho fazendo jogo do galego, e sempre demolidor porque a mestiçagem do negro destrói a capacidade construtiva".